8.10.14

Quem tem a boca cheia
de grande versar
sempre encontra a própria
via de romaria.
Adianta fazer economia?
Uma palavra à toa
pode anunciar Nova Boa,
a volta próxima
do filho aparecido,
parábola de significar sábio,
que diga onde vá dar, por destino,
o teu mirrado presente.
Pode ser somente fado,
cantiga sem compromisso
ora de amor, ora de amigo,
que cuide de abrigar o sorriso
de tua moça, de vexados lábios.
Discursar comprido não espanta
mosquito, nem mutuca
que pressinta mancha de sangue
de vê-la nadar sem roupa
na água baixa do rio
co'a alma alta de canto,
à beira do arco balançando
do luar, acalanto do Sertão.
Pra que mosca não te coma
nem te trave a garganta,
ficando livre o pulmão
pro fino da trova,
só o pito resolve.
Ei-los longe os males bichos da distração.
Tenta então puxar um papo,
do bão, à ponta do barco,
ao pé da fogueira,
ou sentado na cabeceira
da ceia (pois é santa
humildade a opção
de quem senta depois
em última cadeira).
A mão seja parteira
do cigarro e do filão,
enquanto à voz aberta discursas
prosa elevada ao nobre ouvinte,
de generosa verdade servido.
O que farta o comensal
é aquilo que sai do bico,
não o que por ali entre.

Eis o meu tipo ideal
de um banquete de pratão:
um módico repasto de pão,
do de sal, ou do líquido,
ou o vinho de tua cava;
mas o máximo da casa
em azeitada reflexão,
de bem cosidas partes,
à guisa dos convivas;
saborosas narrativas,
em ponto de bala
ou enroladas com artes
de confeitaria;
clara lira,
de encher os olhos d'alma
ainda que de amargar;
testemunhos de inspirar
suspiros e sonhos
no coração da festa.
Passar o café fortificante
é a obrigação do filósofo.
Nem precisa adoçante
do lado de baixo
do coador,
pois se o pensador se afadiga,
não é daqui que retira
o doce da vida.
O escorrer do mel oculta
mais longes delícias.
Muito mal, e saúva,
trouxe o caído açúcar
ao afeto da saúde
dos sítios do país.

 
Mas não assusta se, de súbito,
a palestrada conversa
romper no meio
em silêncio tácito.

 
Nem sempre o verso vale,
por menor,
ter por ele quebrado
o invólucro calar-se.
Em quietude se escola
valiosa e pouco
valorada aula:
saiba amistar sem troça
com as estranhas rejeitadas
criaturas do Nada.
Consinta que o tempo calado,
noite de brisa suspensa,
Não-seja.
Contempla o vácuo mudo,
e caso vejas saltar,
feito de quieta sombra,
quimera de negra cara,
é teu o fantasma criado.
O oco de tudo está pleno
apenas de medos nossos.
O mistério é tu; do
resto, noves fora,
zero.
Há quem ponha seu ente
sob dura casca,

a cabeça feita em pedra:
mas é só furada.
Pra não sofrer dos sentidos sensos
refletidos de muito céu insolente,
bom saber que além da vista
é sombra, e só.
Não sejas como aquele perfumista,
pirado à beça
de tanto encalço
à essência dos seres.
Fora de tua mente, amigo, vazio
é morada do Ninguém;
Nente, Nonada;
Não, do maldito...
Mas já vai excesso no aludido,
deixo como à vista está.
 

Cá se veio, dirá
um conhecido Alberto,
caso compareça vivo,
sobre a mesa posta:
é pa' vê
ou pa' pensá?

Porto Velho (RO)
Agosto de 2014

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